terça-feira, janeiro 19, 2010

o motociclista bom.

(tentando tirar o atraso dos assuntos aqui...)


eu fiquei meio puto da cara quando pintou na TV aquela (essa) campanha do motorista legal. o primeiro comercial que eu vi foi esse acima, do cara que safava o motoqueiro, 90% de chances de ser um motoboy. fiquei puto porque esse filme sozinho transfere a responsabilidade: o motorista é que tem que ter respeito pelos outros - o cara da moto pode ser inconsequente. logo, no meu carro, tenho que prever o imprevisível pra evitar que um idiota morra. depois vi o resto da campanha e saquei que ali tem puxão de orelha pra todo mundo. aí sim, legal.

em todo caso, motoboys são os mágicos do trânsito. do nada eles brotam no teu espelho, em geral quando tu tá fazendo uma passagem de uma pista pra outra, dando sinal. eles não tão nem aí. enfiam o pé (ou o punho) e atiram a moto pra cima de ti. se der merda, tu que te estrepe tentando provar que a culpa é do outro. e ainda periga pintar outro motoboy pra testemunhar a favor da classe. mas motoboy é apenas a caricatura da coisa. motoqueiros em geral aprontam horrores por aí. e eu já ruminava toda a minha raiva contra a campanha quando lembrei duma coisa que me aconteceu no final de 2008, no início da dom pedro II, logo depois da saída do viaduto da assis brasil.

eu tinha ido num cliente lá passando o aeroporto, perto da fronteira com santa catarina... nah, tou brincando. era na ceasa. na volta, peguei a perimetral às 18:30. subi e desci o viaduto pela pista da esquerda, o que fez com que, graças à esperteza dos nossos engenheiros de trânsito, eu do nada me encontrasse na pista do ônibus, rumo ao corredor central. resolvi trocar para a pista à minha direita, e obviamente ninguém me deixou passar. entendo os outros. eu devia ter planejado isso antes, e ninguém quer perder o sinal verde. de repente a fila parou e eu pude entrar. quem segurou a fila pra mim era... um cara de moto.

odeio motoqueiros que passam a mil pelo corredor quando tu tá ali parado, esperando o sinal abrir, mas eu precisava retribuir pro cara. colei meu carro no canteiro central e abri espaço pro cara passar. 10 motoboys passaram, o cara não. insisti. mais 10 motoboys, o cara seguia atrás de mim, bem no meio do meu retrovisor. ainda tentei de novo, e mesma coisa.

entendi que eu tava diante, ou melhor, à frente de uma cabeça privilegiada. e apesar de sacar de todos os riscos envolvidos, botei meu carro pra direita na pista, ferrei com todos os 10 motoboys que passariam por ali e abri um espaço pro cara à minha esquerda, entre eu e o canteiro. o cara não veio. abri o vidro e chamei ele, ele meio que titubeou, mas veio. tudo era absurdo: o cara plantado atrás de mim, eu chamando ele pra bater um papo na perimetral lotada... falei pra ele:
- cara, sei lá. preciso te dar a real. nunca vi isso antes. tu é o primeiro motoqueiro que não costura e não passa voando pelo corredor.
o cara ficou tri sem jeito, e pelo que ele disse, não sem motivo:
- po, velho. valeu! e pior que eu conto pras pessoas e ninguém acredita em mim!
- sim. tu nunca sabe de onde vai sair um maluco a milhão, dá medo até de trocar de pista.
- pois é. eu prefiro gastar uma horinha a mais pra chegar em casa do que ficar me arriscando. mas o pior é isso: eu conto que eu faço isso e os caras acham que eu tou de sacanagem...
- po, meus parabéns, cara. tu é uma cabeça diferente, mesmo.
- heheh. valeu!

fechei o vidro. ele deu ré com os pés e VOLTOU pro lugar dele, atrás do meu carro. depois quando eu dobrei num retorno, passou por mim e deu uma buzinadinha. achei engraçado que, por pura curiosidade de falar com uma figura dessas, eu acabei praticamente "fazendo o dia" do cara. mas é aquela velha história: as pessoas só reconhecem teus atos de bondade triviais, porém constantes, o dia que tu pega uma metralhadora e mata 8 no cinema do shopping. aí alguém vem e diz:
- o fulano?? sério?? mas ele era tão bom...

e nunca mais vi motoqueiro fazer NADA parecido.